Como lidar com as mudanças que a adolescência traz para as relações familiares?

A chegada     da     adolescência transforma de maneira definitiva a vida dos filhos. Eles antes tão próximos, passam a se afastar, preferindo a presença dos amigos à companhia dos pais e familiares.

É bastante frustrante para os pais que percebem essa mudança. Esse afastamento é sentido como perda da intimidade e da cumplicidade que os pais tinham com os filhos e que durou até aquele momento.

Mas é importante ter calma. Os adolescentes fazem um importante movimento de se afastar dos pais e se aproximar dos amigos porque eles se preparam aos poucos para ganharem o mundo, questionarem seus valores e fazerem suas escolhas.

É o momento da construção da identidade, experimentando uma importante crise, descrita por Erik Erikson como a fase Identidade versus Confusão quando ele descreve uma das etapas do Desenvolvimento Psicossocial.

Tudo isso é esperado e até certo ponto desejado. Um filho que não sai do estado infantil de dependência dos pais terá muita dificuldade em se tornar um adulto pleno com autonomia e responsabilidade.

Porém, esse isolamento que acontece para que o adolescente possa se questionar sobre tudo aquilo que compõe a sua essência pode esconder pontos importantes, como:

  • Mascarar estados de sofrimento emocional;
  • Dúvidas importantes a respeito do futuro;
  • Relacionamentos tóxicos, principalmente após o advento e crescimento da vida digital.

Muitas vezes o adolescente se isola no quarto por estar em estado depressivo ou com a tentativa de se esquivar socialmente.

A depressão e ansiedade, assim como o comportamento suicida, têm crescido muito entre os jovens nos últimos anos, principalmente após o período de pandemia. Muitos ficam isolados por temerem enfrentar seus fantasmas e dúvidas, por se sentirem impotentes e incapazes.

Mutras vezes, o isolamento social esconde comportamentos de risco como o acesso a grupos e mídias sociais que induzem a comportamentos autodestrutivos como aqueles que orientam a automutilação, suicídio, uso de drogas ou o cyberbullying.

São situações postas pela realidade atual e que não existe possibilidades de se impedir, pois o computador, a internet e as redes sociais são parte de uma realidade das crianças e adolescentes na Era Digital e que veio para ficar.

Mas como cuidar de filhos adolescentes, impedindo que eles se envolvam em situações de risco?

Essa não é uma pergunta simples de responder, pois é importante avaliar a realidade de cada família, seu conjunto de crenças e valores, mas principalmente o nível de assertividade, comunicação e afetividade que os pais sempre tiveram com os seus filhos desde que eram crianças.

Também    é     importante    considerar    aspectos     individuais       dos     próprios adolescentes. Como eles enfrentam suas dificuldades, como é sua autoestima e como eles acreditam em seus potenciais.

Todos os pais viverão na adolescência de seus filhos momentos de conflitos e desentendimentos, pois eles invariavelmente questionarão a autoridade dos pais como forma de se preparem para irem em busca dos próprios ideais.

Entretanto, os adolescentes nunca foram adultos e não estão totalmente prontos para fazer todas as escolhas.

Os pais precisam estar próximos, atentos, mas precisam respeitar a opinião dos filhos, acolher sua inconsistência sem desmerecer a sua imaturidade.

É necessário que pais tenham respeito à individualidade do adolescente, porém que tenham também algum nível de controle sobre as escolhas arriscadas que eles fazem. fí um equilíbrio bastante tênue e delicado de ação, mas que os pais vão precisar ter.

A parentalidade democrática, que respeita a individualidade do filho, porém, ensina que tudo na vida tem uma consequência é a forma de ação que os pais precisam adotar. Não é fácil, aliás, é bem mais trabalhoso, pois exigirá dos pais coerência, consistência e assertividade.

Muitas  vezes  parecerá  ser  mais  fácil  adotar  uma  atitude  autoritária  ou permissiva. Esses modelos de parentalidade mais conhecidos dá menos trabalho, porém o resultado no longo prazo não é bom, pois não desenvolve no jovem o senso de responsabilidade.

Os pais precisam monitorar os amigos e lugares que os adolescentes frequentam, mas entender que eles estão construindo um conjunto de novos valores que são diferentes dos que os pais tiveram quando eram adolescentes.

Por exemplo, hoje e sempre será arriscado dirigir embriagado, principalmente sem habilitação. Entretanto, se um adolescente ir a uma festa e ficar com três ou quatro pessoas diferentes não significa que o jovem é promíscuo ou descomprometido com os relacionamentos sérios e não seria motivo para críticas ou punições.

Somente quando os pais desenvolveram com os filhos enquanto eles ainda eram crianças uma relação de respeito e de autoridade (não autoritarismo) com regras claras, consistentes, baseadas no exemplo (modelo), afeto, respeito e na consequência é que os filhos poderão confiar melhor nos pais.

Essa confiança não se quebra durante a adolescência, apenas se modifica, e será o ponto de referência que os jovens poderão acessar sempre que estiverem imersos no seu mundo e perceberem sinais de perigo à sua integridade.

Os pais sempre serão o principal ponto

de apoio de seus filhos sejam eles crianças, adolescentes ou adultos. Porém, os pais jamais serão seus melhores amigos.

A figura  de  pais  é  o  que  garante  ao

adolescente a certeza de existe um adulto para poder ajudá-los nos momentos  de incertezas e instabilidades.

Os pais, por sua vez, podem se sentir perdidos ou confusos, sem orientação de como agir em determinadas situações.

Nesse momento é que os pais precisam buscar a ajuda necessária através de terapeutas e profissionais de saúde mental (psicólogos e psiquiatras) que poderão norteá-los em como agir em situações mais complexas.

Como já havia mencionado anteriormente, não há uma maneira única para agir na lida com o filho adolescente. fí um processo complexo que poderá ser mais bem desempenhado se os pais estiverem dispostos a se reverem e abertos a escutar seus filhos, porém se mantendo como os adultos na situação.

Referência:

1) Erik Homburger Erikson, Joan Mowat Erikson. The Life Cycle Completed: Extended Version with New Chapters on the Ninth Stage of Development

Dr. Miguel Ângelo Boarati
Psiquiatra da Infância e Adolescência

Formado pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP Especialização em Psiquiatria Geral pela mesma instituição e em psiquiatria infantil pelo Instituto de Psiquiatria (IPq) do HCFMUSP

Supervisor de médicos residentes em psiquiatria geral e infantil no IPq- HCFMUSP de 2006 a 2016

Professor de pós-graduação em Suicidologia pela USCS e de Psicologia Analítica do Instituto Ânima de Ribeirão Preto

Professor da Pós-Graduação em Psiquiatria pelo CENBRAP

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