Para tudo nessa vida existe um limite. Caso alguém exagere em algum ponto, logo vem sérias consequências. E quando se trata de questões nesse sentido durante a infância, o caso é mais delicado. No tocante ao uso indisciplinado do celular, grande tem sido o esforço de muitos pais para desviar a atenção da criança para algo mais atraente. Porém, haveria atividades mais interessantes que possam ultrapassar o tão temido poder da tecnologia?
Seguindo nessa vertente, o psiquiatra Miguel Angelo Boarati, formado pela Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto (SP) com especialização em Psiquiatria da Infância e Adolescência, atuante em clínica privada e como professor de especialização em Psiquiatria do CENBRAP e do Instituto Ânima de Terapia Junguiana, concedeu entrevista para o CULTURA VIVA e orienta aos pais quanto ao uso exagerado do celular.
Acompanhe o bate papo!
CULTURA VIVA: Com que idade os pais podem apresentar o celular a seu filho? MIGUEL ANGELO BOARATI: De preferência somente quando a criança tiver condições de ter um uso controlado ou, quando for essencial, para os estudos e socialização escolar. Nunca antes dos 7, 8 anos, justamente para evitar o uso descontrolado. O celular e o tablet são altamente estimulantes e a criança precisa de outras formas de estímulos, como brincadeiras físicas (correr, pular, jogar) e criativas (brincadeiras de faz-de-conta).
C.V.: Quais são os prós e contras da criança que começa a fazer uso do celular antes dessa idade?
M.A.B.: Não vejo nenhuma vantagem em usar o celular durante a primeira e segunda infância justamente pelo risco de diminuir o interesse em outras áreas.
C.V.: Em que pode ser prejudicial, em específico, o uso excessivo do celular durante a infância?
M.A.B.: O uso excessivo prejudica o sono, a socialização, o desenvolvimento de habilidades físicas (motricidade fina, funções executivas) e também de outros interesses.
C.V.: Para a criança que já está viciada no celular o que os pais podem fazer? Há dicas mais atraentes para substituí-lo?
M.A.B.: Evitar a exposição precoce e, quando o oferecer para a criança, estabelecer tempo de uso (uso controlado). Às vezes, os pais dão o celular para terem um pouco de tranquilidade, mas esquecem que a criança precisa ser exposta a outros estímulos e interesses. Depois, fica difícil modificar esse comportamento. Entre as dicas, propor outras atividades interessantes como brincadeira ao ar livre, cinema e passeios. Mas, é importante que os pais se dediquem aos filhos de maneira sincera e verdadeira.
C.V.: E no momento em que já podem fazer uso do celular, o que é permitido e o que não é a uma criança?
M.A.B.: Não se deve permitir acesso irrestrito, como vídeos de conteúdos violentos ou pornografia. Também é importante controlar as redes sociais, pelo risco de interações inadequadas como rede de pedofilia.
C.V.: E como disciplinar o filho se os pais só vivem no celular?
M.A.B.: Exatamente, os pais precisam ser modelo para exigirem do filho um comportamento diferente.
C.V.: Que recado o senhor dá aos pais sobre os limites a impor sobre o uso do celular na infância?
M.A.B.: A principal orientação que vale não somente para o uso de celular, mas para outros contextos de educação de crianças é o uso de técnicas indutivas que visam encorajar o comportamento desejável e/ou desencorajar o indesejável através de argumentação compatível com a compreensão da criança, estabelecendo regras e limites, demonstrando consequências lógicas de uma ação, explicando, discutindo, negociando e obtendo ideias da criança sobre o que é justo e certo. São eficazes, duradouros, ajudam a desenvolver empatia, porém, dão muito mais trabalho aos pais.
Foto: Arquivo pessoal do Dr. Miguel Angelo Boarati