Reportagem sobre suicídio na adolescência

A prevenção do suicídio em adolescentes envolve a criação de um ambiente de apoio, onde os jovens se sentem ouvidos e compreendidos. Educação e conscientização sobre saúde mental são fundamentais, tanto para adolescentes quanto para pais, educadores e profissionais de saúde. A identificação precoce de problemas de saúde mental e o acesso a serviços de apoio, como terapia e aconselhamento, são componentes cruciais da prevenção.

É importante que qualquer ameaça ou sinal de suicídio seja levado a sério e tratado com urgência. Os adolescentes devem ser incentivados a buscar ajuda quando estiverem enfrentando dificuldades emocionais. A intervenção precoce e o apoio emocional adequado podem fazer a diferença na prevenção do suicídio em adolescentes.

Dr. Miguel Boarati responde:

Afinal, devemos ou não divulgar casos de suicídio? Tem o jeito correto? Isso pode estimular outros casos ou pode servir para a prevenção?

Não se deve divulgar os casos de suicídio, principalmente descrever detalhes, motivos, cartas de despedidas ou fotos. Existe um efeito de “contágio coletivo” chamado Efeito Werther, criado a partir de um fenômeno ocorrido quando da publicação de uma obra de Goethe (1774) chamado “Os sofrimentos do Jovem Werther” onde o protagonista se suicida por amor não correspondido. Diversas pessoas se suicidaram de forma semelhante ao protagonista.

A “glamorização” do suicídio seria uma das explicações para esse fenômeno. O suicídio de pessoas famosas ou que tiveram a morte amplamente divulgada, principalmente na mídia, aumentam as chances de suicídio, principalmente em pessoas em estado de vulnerabilidade.

No entanto, o assunto deve sim ser tratado e com muito cuidado, criando ações de acolhimento para os enlutados pelo suicídio e com ações precisas abrindo espaços para conversa, mas que deverão ser feitas em ambientes de cuidado e grupos bem conduzidos por pessoas experientes.

O sofrimento afeta as pessoas diretamente relacionadas à pessoa que se suicidou (familiares, amigos e colegas próximos) e também pessoas que estão indiretamente relacionadas, como vizinhos e conhecidos.

É diferente o impacto quando se trata do suicídio de uma criança ou adolescente?

Sim, significativamente mais.

Existe uma crença coletiva de que esse fenômeno não ocorre em crianças e adolescentes, exceto quando há um problema muito grave. No entanto, os gatilhos são diversos e se modificam ao longo do desenvolvimento.

Crianças e adolescentes estão no inicio da vida e possuem um longo tempo de existência e sempre fica para as pessoas ao redor um forte sentimento de culpa, principalmente para os pais.

O que dizer sobre a prevenção em casa?

Estudos mostram que o comportamento suicida aumenta dentro famílias com histórico de suicídio e também quando existem algum transtorno psiquiátrico associado como depressão, uso de drogas, comportamento impulsivo e problemas de relacionamento.

Os pais precisam ficar atentos a mudanças nos comportamentos dos filhos, como piora do rendimento escolar, isolamento, desregulação emocional, desesperança e súbito interesse por temas mórbidos.

Os pais, apesar de estarem próximos aos filhos, muitas vezes não conseguem perceber os sinais, pois os jovens muitas vezes se fecham para eles.

E a prevenção na escola?

A escola é o principal ambiente fora de casa onde crianças e adolescentes ficam. Muitas experiências fortes, boas e ruins, acontecem na escola.

Principalmente alunos com baixo desempenho social e acadêmico, que fica muito isolado ou que é vítima de bullying se tornam fortes candidatos a comportamentos autodestrutivos como o suicídio.

Como a escola deve lidar quando acontece?

Um suicídio consumado causa um impacto devastador em todas as pessoas da escola, de alunos e familiares a professores, passando pela coordenação e demais funcionários.

É preciso que se crie espaços para se conversar sobre o fato e qual são os sentimentos observados, que são os mais variados passando para tristeza, impotência a revolta e indignação.

A escola não deve silenciar o assunto com medo de aumentar os casos, mas tratar com o devido cuidado.

O comportamento suicida vai além da tentativa e consumação, mas passa pela ideação e pelo planejamento.

O número de jovens, mesmo sem um diagnóstico confirmado de transtorno mental ou problemas familiares, já apresentaram pensamentos de morte, ideia de como acabar com a vida e tentativas (uma ou mais ao longo da vida escolar) ao longo da adolescência

Precisamos lembrar que o suicido é a 2ª causa de morte em adolescentes dos 12 aos 19 anos.

Muitas pessoas buscam culpados e acabam julgando pais ou colegas. O que dizer sobre isso?

Não existem culpados, mas situações que culminam com esse desfecho trágico. É importante que haja o debate para que medidas preventivas sejam adotadas.

Cuidar da saúde mental dos mais jovens é fundamental para que possa prevenir o comportamento suicida, principalmente por ser uma fase da vida em que estamos em desenvolvimento e não possuímos maturidade e repertório de enfrentamento dos problemas e situações difíceis totalmente desenvolvidos.

Também é importante cuidar das relações familiares. Pais e filhos se afastaram e os papéis ficaram confusos nas últimas décadas. Pais não são os amigos dos filhos e nem os donos da verdade, mas são as pessoas mais importantes que os filhos têm para se apoiarem e se conduzirem. Muitas vezes esse papel fica pesado para os pais, que confusos e angustiados se distanciam dos filhos sem perceber.

A que sinais pais devem ficar atentos?

Sinais que possam sugerir que os filhos estão em sofrimento. Além de sinais que se assemelham a quadros de humor depressivo, também ficar atento quando o jovem não demonstra expectativa com o futuro, não busca atividades que antes lhe davam satisfação e começam a ficar muito tempo isolados das pessoas e somente nas telas.

Bullying por si só pode ser causa de suicídio ou envolve outros fatores?

O bullying é o pior tipo de assédio moral que pode acontecer com um jovem. O dano emocional é imenso.

Antigamente o bullying ocorria predominantemente nas escolas e nos locais de agrupamento de jovens como agremiações, condomínios e clubes.

Entretanto, com o advento do cyberbullying que é o bullying que acontecem nas redes sociais e pela internet o problema foge do controle.

A dimensão da violência principalmente psicológica, mas também física que a vítima fica sujeita pode ser um importante gatilho para a tentativa de suicido. Os principais temas que são intensamente explorados na prática do bullying estão relacionados às dificuldades do jovem como problemas na socialização, fracasso acadêmico, características físicas, condição socioeconômica e sexualidade.

Hoje existem leis que coíbem a prática do bullying e a sociedade como um todo precisa ficar atenta, especialmente a escola e a família.

Mais algum ponto a acrescentar?

Gostaria de citar o projeto coordenado pela psicóloga Karina Okajima Fukumitsu, especialista em suicidologia chamado “Raise, somos mudanças” que apresenta uma série de ações de cuidado para o sofrimento existencial e que também atua em ações de prevenção, posvenção e acolhimento para os enlutados por suicídio. Esse projeto prevê reuniões para familiares e amigos de pessoas que se suicidaram. Vejo essa e entre outras importantes ações espalhadas pelo país como uma das importantes formas de cuidado.

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